Seguindo com a elaboração da narrativa histórica a respeito do nosso querido Mestre e de sua sagrada Doutrina relatamos aqui os passos que trouxeram ao mundo a egregora do Daime. Por volta de 1930, após se despedir da Guarda Nacional, o bravo peregrino saiu em busca de sua “terra prometida”, um local onde poderia juntar outros irmãos e irmãs e formar sua comunidade Espiritual. Os antigos dizem que ele primeiro tentou se aventurar numa ‘terra do governo’, atrás do antigo meio de invasão junto a outros aventureiros, mas a terra era da 4ª Companhia do exército e não houve êxito. Seu sábio coração evitou que ele comprasse aquela guerra. Assim, partiu novamente em sua jornada, na consciência se recordava das palavras da rainha que nada iria lhe faltar. Ele possuía ainda algum dinheiro que juntou na corporação militar. Com fé e persistência, logo lhe apareceu à terra esperada.

Chegou, portanto, o início dos trabalhos do Daime na Vila Ivonete, que duraram até 1945. Um grupo de seringueiros vindo da floresta ocupou as terras do seringalista Barros, sem conflito ou resistência, agora Irineu poderia começar seus trabalhos plantando e criando o que viria comer. Com o labor de sua mão ergue a primeira casa com barro do chão, vivendo de modo simples e honrado, manifestando o exemplo do caminho para quem fosse acompanha-lo. Assim foi juntando os primeiros discípulos, morando ao seu redor e em trabalho coletivo, a fartura era de todos – a realização de um sonho antigo. Ninguém seria o dono da terra, toda comunidade que nela trabalhasse poderia usufruir de seus frutos.

O Daime nesse local firmou raízes por 15 anos, cerca de 20 anos após a aparição de Nossa Senhora da Conceição, Mestre Irineu constituiu o início de sua comunidade, nessa época ainda sem a identificação de Daime e longe de ser a Doutrina com o ritual deixado em 1971. Da comunidade que se formava destaca-se a presença de seringueiros nordestinos, negros em sua maioria, gente simples e sofrida que foram para a floresta com o sonho de enricar e onde so encontraram desilusão, vivendo em regime de servidão, com uma divida que nunca conseguiriam pagar, sofrendo nos ‘braços do patrão’ e enfrentando a ferocidade dos barões.

Foram esses os desafios iniciais de Mestre Irineu, liderar uma comunidade extremamente carente e começar seu trabalho sem despertar a ira dos barões, donos do poder. Homem simples e verdadeiro, egrégio de uma corporação militar, tinha com sua experiência condições para prosseguir em sua caminhada, contudo estando sempre atento aos desafios à sua frente. Esse início foi difícil, muitos desafios se apresentaram, mas ao mesmo tempo, muitos amigos foram se unindo a ele, entre todos, destaca-se um jovem chamado José das Neves, comerciante de Rio Branco, dono de padaria, que em 1931 se aproxima da comunidade tomando parte dos trabalhos em 26 de maio, se tornando discípulo do mestre e a partir daí prestando auxilio a comunidade doando mantimentos para ela.

Outros irmãos chegaram, vieram trazendo força de trabalho e alguns recursos que a todos beneficiavam, erguendo construções, melhorando as moradas. São diversos nomes que somaram força ao início da Missão, ajudando a materializar a orientação que o Mestre recebeu 20 anos atrás, que sempre teve como propósito testificar o sagrado com respeito e reverencia a ayahuasca.

Em 1933 Irineu viveu novo casamento, Raimundo Franco se tornou sua esposa, ela era descendente de indígenas, ‘mulher de fibra’, trabalhava duro na roça e acompanhou o inicio dos trabalhos com a ‘Uasca’ se tornando pessoa de confiança do Mestre, aprendendo tudo que ele ensinava. Mestre Irineu tinha 44 anos de idade e dona Raimunda 19.  Na certidão de casamento de Irineu com Raimundo consta a data de 1937 e nela esta o registro de que Raimundo fora batizada no Maranhão. Em meio a tanta gente vivendo no Acre foi justamente com uma jovem do Maranhão que Mestre Irineu viveu seu matrimonio mais duradouro, foram 20 anos de casamento, que durou até 1953. Dizem os relatos que a Rainha Clara não aprovou esse casamento e por isso, por mais que houvesse integração entre o casal e a comunidade espiritual, os conflitos inevitáveis, levaram ao rompimento.

Aos poucos mais discípulos foram chegando em busca de uma nova morada, encontrando uma morada celestial encantada pela Rainha da Floresta com as plantas sagradas. Foi com esse sentimento de fé e devoção que a comunidade iniciou os Trabalhos de Cura em 1931: todas as quartas-feiras eram feitos os trabalhos de concentração em silêncio, atendendo as necessidades dos aflitos que procuravam por alguma benção que pudesse aliviar suas dores e acabar com a moléstia. Nesses trabalhos Mestre Irineu estava sempre presente, pronto para o trabalho, com um sorriso no rosto e uma grande educação. Esse seu jeito carismático foi cativando muita gente. Nascia um grande líder para toda a comunidade.

Dando prosseguimento em sua missão sagrada, Mestre Irineu começou os Trabalhos de Concentração com uma hora e meia de duração aos sábados, realizando palestras com forte instrução, do sentido da vida à paixão do coração, a tudo ele aconselhava, nascia assim o Mestre Imperador, um grande professor reconhecido por sua sabedoria. Suas preleções vinham antes do trabalho começar, acompanhava a vida da comunidade e mais o que lhe sua intuição lhe mostrava, rogando pela humanidade tão aflita em convulsão. Era ampla a admiração, por isso lhe chamaram de mestre: através da palavra Mestre Irineu implantava a tradição, atuando como professor, ensinando a todos os valores repassados pela rainha.

Os trabalhos eram em silêncio, quando muito o comandante solfejava dentro da miração, assovios dos espíritos da antiga tradição, que aprendeu com os caboclos, herança indígenas dos ikaros. O ‘sopro da vida’ devia ser manifesto numa certa ocasião, trazendo fluidos de mundos além, limpando o ambiente, purificando o paciente da sagrada medicina.

Com o início rela da missão, Mestre Irineu recebeu novas revelações, sendo esta a época de apresentação do primeiro nome atribuído ao trabalho do Daime: CENTRO LIVRE, como disposto no Hino 39:

Centro livre centro livre

É preciso ter amor

A minha mãe que me mandou

A minha mãe que me mandou

Minha mãe prenda querida

Minha mãe prenda querida

Minha mãe prenda querida

Estou com vós eterna vida

Estou com vós eterna vida

Estou com vós eterna vida

Currupipipiracuá

Eu devo chamar aqui

Eu devo chamar aqui.

Centro Livre será o nome espiritual que acompanhará toda a trajetória da tradição, todavia não será ele o nome pelo qual a comunidade foi formalmente institucionalizada ao término de sua terrena missão… O certo é que a identidade central virá com o novo batismo da bebida ancestral pelo nome de DAIME: um rogativo de paz ao Senhor do Universo. Daime era o pedido que o velho peregrino trazia em seu coração: “dai-me amor, dai-me amor, dai-me tudo quanto é bom dai-me o pão do Criador” Essa era sua singela oração ensinando aos seus irmãos a postura de humildade que deveriam ter perante o poder superior, que sempre doava  a vida pelo sopro divino. O verbo era DAR, a caminhada uma integração nos mistérios ocultos da sabedoria anciã, conciliando culturas diferentes em símbolos e ritos sagrados , nascia assim o DAIME para se firmar na eternidade como uma tradição de valor, com paciência o chefe da missão seguia seus passos, aberto aos ensinos que vinham de longínquas esferas.

Na primeira visão com a “Lua Branca”, o verbo divino já havia se manifestado numa suplica de salvação: ‘Oh Mãe Divina do coração, lá nas alturas, onde esta minha mãe, lá no céu, dai-me o perdão’. Entretanto será com o hino Estrela D’água que o vero irá se manifestar com a glória e graça da Rainha:

Vou chamar a estrela d’Água

Para vir me iluminar

Para vir me iluminar

Para vir me iluminar


Dai-me força e dai-me amor

Dai-me força e dai-me amor

Dai-me força e dai-me amor

Dai-me força e dai-me amor


Dá licença eu entrar

Dá licença eu entrar

Nas profundezas do mar

Nas profundezas do mar


Foi meu pai quem me mandou

Foi meu pai quem me mandou

Conhecer todos primores

Conhecer todos primores


Dai-me força e dai-me amor

Dai-me força e dai-me amor

Dai-me força e dai-me amor

Dai-me força e dai-me amor

A minha mãe que me ensinou

A minha mãe que me ensinou

Conhecer todos primores

Conhecer todos primores


Com amor no coração

Para cantar com os meus irmãos

Para cantar com os meus irmãos

Para cantar com os meus irmãos. 

Seguindo os novos aprendizados, uma grande revelação lhe aconteceu, aquela que seria a maior de todas, em seguimento daquela primeira, da Virgem da Conceição: se dela ele era um filho verdadeiro, era seu legitimo herdeiro, mestre não apenas de homens, mas de um “mundo inteiro”: era ele JURAMIDAM, o Mestre Imperador – todavia sua cadeira no ‘Astral’ somente lhe foi entregue sete dias antes de sua despedida do mundo material. Com Juramidam, um novo batismo lhe acontece, seu nome vem por divina instrução, completando a ‘Doutrina da Rainha’.

Mistérios que vamos vislumbrando a medida que avançamos em nossos estudos sobre a vida deste distinto senhor.